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terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Jards Macalé


Nos últimos anos o cinema brasileiro vem privilegiando a música popular como assunto de cinebiografias. Desde "Loki" - Arnaldo Baptista (sucesso de público no Festival do Rio 2008), "Herbert de Perto", sobre o líder da banda Paralamas do Sucesso, até "O Homem que Engarrafava Nuvens", sobre o compositor de baiões Humberto Teixeira, passando por "Pan-Cinema Permanente", bela homenagem ao poeta e compositor Wally Salomão, e entre estes o documentário "Jards Macalé: Um Morcego na Porta Principal", vencedor do prêmio do júri no Festival do Rio 2008, entrou também em circuito.


Controverso e inspiradíssimo, Jards Macalé é um agitador multicultural a quem o Brasil deve muitas de suas pérolas artísticas. Ter sua trajetória documentada, mais do que justo é também a certeza de que esta história estará salva para as próximas gerações. (aqui)

Jards Anet da Silva, o Macalé, é uma contradição ambulante. De personalidade fortemente contestadora, não hesita em se dizer patriota, ordeiro, pontual e estudioso. Formado na melhor tradição da música popular e erudita, o carioca de 67 anos protagonizou ou coadjuvou alguns dos maiores distúrbios contraculturais da história do país. É parceiro de uma lista impressionante de magníficos poetas, cineastas, artistas plásticos, músicos e gente de teatro...



VIDA E OBRA
 
Jards Anet da Silva (Rio de Janeiro, 3 de março de 1943), conhecido como Macalé, é um ator, cantor e compositor brasileiro.

Nasceu no bairro da Tijuca, ao pé do Morro da Formiga, rodeado de música: no morro, os batuques; no vizinho, Vicente Celestino e Gilda de Abreu. E em casa, os foxes, as valsas e as modinhas tocadas ao piano pela mãe, dona Lígia, (que também cantava) e no acordeom, pelo o pai. O coro familiar tinha Roberto (o irmão caçula) e Jards. No rádio, Orlando Silva, Marlene, Emilinha Borba.

Ainda menino, mudou-se para Ipanema, onde ganhou o apelido de "Macalé" - nome do pior jogador do time do Botafogo, à epoca. Adolescente, formou seu primeiro grupo musical - o duo "Dois no Balanço"; veio depois o Conjunto Fantasia de Garoto, de jazz, seresta e samba-canção.



Estudou piano e orquestração com Guerra Peixe, violoncelo com Peter Dauelsberg, violão com Turíbio Santos e Jodacil Damasceno, análise musical com Ester Scliar.

Começou carreira profissional em 1965, como violonista no Grupo Opinião. Fez direção musical dos primeiros espetáculos de Maria Bethânia. Teve composições gravadas por Elisete Cardoso, Nara Leão. Com Gal Costa, Paulinho da Viola e o parceiro José Carlos Capinam, criou a agência Tropicarte, para administrar os próprios espetáculos.

Em 1969, participou do 4.º Festival Internacional da Canção apresentando a canção Gotham City, e lançou o primeiro disco, "Só Morto".

Trabalhou com Gal Costa no disco Le-Gal e no show Meu nome é Gal. Em 1971, foi para Londres, a convite de Caetano Veloso, com quem tocou e gravou. No mesmo ano, volta ao Brasil, e lança seu primeiro LP, Jards Macalé.

Em 1974, lançou o LP Aprender a Nadar. O álbum contou com arranjos de Macalé, Perinho Albuquerque e Wagner Tiso. Os músicos participantes fazem jus ao resultado, como são muitos citarei apenas alguns: Robertinho Silva (Bateria e Percussão), Dino (Violão 7 Cordas) e Meira (Violão), Canhoto (Cavaquinho), Rubão Sabino (Baixo), Tutti Moreno (Bateria), Carlinhos Pandeiro de Ouro, Zeca da Cuíca e Wally Saillormoon.

O repertório traz a participação de Ana Maria Miranda e Lygia Macalé, a primeira faixa intitulada "Jards Anet Da Vida" é uma espécie de auto apresentação que Jards faz sobre um texto de Gilberto Gil misturada com mais três composições chamadas: "Dois Corações" de Herivelton Martins e Waldemar Gomes, "No Meio Do Mato" de Jards e "O Faquir Da Dor" de Jards e Wally.

"Rua Real Grandeza", composição de Jards e Wally; "PAM PAM PAM", de Paulo da Portela, faixa que funciona como vinheta no álbum. "Imagens", composição de Walzinho e Orestes Barbosa (exatamente o mesmo de "Chão De Estrelas"), o arranjo é de Perinho Albuquerque, rei da elegância e das sutilezas. Ainda tem três faixas para fechar o lado A do disco, são elas: "Anjo Exterminado", um dos melhores sambas da dupla Jards e Wally, "Dona De Castelo", também da dupla e por último "Estatuto de Gafieira", excelente samba de Bily Blanco que discorre sobre o que não deve ser feito na gafieira...

O Lado B do álbum, traz "Mambo Da Cantareira", composição de Barbosa da Silva e Eloide Warthon, interpretado por Gordurinha. Um tema dançante, apesar de tratar-se da lamúria de um cidadão que mora em Niterói e viaja na cantareira todos dias pois trabalha em Madureira (quase 40Km de distância), provavelmente deve ter sido de onde saiu o nome do álbum "Aprender A Nadar".


Tá vendo como é que dói
Tá vendo como é que dói
Trabalhar em madureira
Viajar de cantareira
E morar em niterói

Ei cantareira
Ei cantareira
Vou aprender a nadar

Ei cantareira
Ei cantareira
Eu não quero me afogar.

Neste álbum, Jards apresenta não só sua interpretação do mambo como também outra composição do cantor Gordurinha: a divertidíssima "Orora Analfabeta", sobre uma bela e nobre dama que comete, erros drásticos de português, O samba-de-breque "Oróra Analfabeta", composição hilária de Gordurinha e Nascimento Gomes, fala da tal dona que é um espetáculo 'mas não sabe ler e nem tampouco escrever', letra muito bem humorada.


"E Daí?...", composição de Miguel Gustavo, que Wagner Tiso arranjou de forma magistral e acrescentou o tema "Mora Na Filosofia", de Monsueto, como música incidental.


"Senhor Dos Sábados" de Macalé e Wally e "Bonéca Semiótica", de Macalé, Rogério Duarte, Duda e Ricardo Chacal, no arranjo Perinho Albuquerque faz uma citação de "Insensatez", de Tom Jobim.


A conclusão do disco se dá com uma vinheta em off de "Dois Corações", música que na primeira faixa é apenas declamada, cantada por Lygia Macalé que encerra a 'mini-canção' com uma risada bem gostosa.

Em outras palavras, o que temos aqui é um grande álbum de um artista que 'aprendeu a nadar'. Aliás, na ocasião do lançamento deste LP, Jards Macalé atirou-se de uma barca da Cantareira nas águas da Baía da Guanabara...

Faixas:
1. Jards Anet da Vida / Dois Corações / No Meio do Mato / O Faquir da Dor
2. Rua Real Grandeza
3. Pam Pam Pam
4. Imagens
5. Anjo Exterminado
6. Dona do Castelo
7. Estatuto da Gafieira
8. Mambo da Cantareira
9. E Daí...? (com Mora na Filosofia)
10. Orora Analfabeta
11. Senhor dos Sábados
12. Boneca Semiótica
13. Dois Corações

Jards Macalé participou como ator e compositor da trilha sonora dos filmes Amuleto de Ogum e Tenda dos Milagres, de Nelson Pereira dos Santos. Também compôs para as trilhas sonoras de Macunaíma de Joaquim Pedro de Andrade, O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, de Glauber Rocha, A Rainha Diaba, de Antônio Carlos Fontoura, Se segura, malandro!," de Hugo Carvana; Getúlio Vargas, documentário de Ana Carolina. Compôs também trilhas sonoras para teatro.

Em 1976, se tornou parceiro de Moreira da Silva no samba de breque Tira os óculos e recolhe o homem.

Macalé é autor de canções como: Vapor Barato, Anjo Exterminado, Mal Secreto, Movimento dos Barcos, Rua Real Grandeza, Alteza, Hotel das Estrelas, Poema da Rosa. Teve como parceiros Capinam, Waly Salomão, Torquato Neto, Naná Vasconcelos, Xico Chaves, Jorge Mautner, Gláuber Rocha e ainda Abel Silva, Vinícius de Morais, Fausto Nilo. Entre os intérpretes de suas canções, estão Gal Costa ("Hotel das Estrelas" e "Vapor barato"), Maria Bethânia ("Anjo exterminado" e "Movimento dos barcos"), Clara Nunes ("O mais-que-perfeito"), Camisa de Vênus ("Gotham City") e O Rappa ("Vapor Barato"), entre outros.

Embora tenha também parcerias com Gilberto Gil e Caetano Veloso, rompeu com eles por considerar que o tropicalismo havia sido cooptado pela indústria cultural, perdendo a independência.



Discografia

Só Morto (compacto de 1970)

Jards Macalé* (1972)


Jards Macalé - Farinha do Desprezo - (1972)

Banquete dos Mendigos (LP duplo), em homenagem ao 25º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Gravado ao vivo, com vários artistas (1973);

Aprender a nadar (1974).

Mambo da Cantareira (Barbosa da Silva - Eloide Warthon).
Do disco Aprender a Nadar, 1974.

Contrastes (1977)
Quatro Batutas e um Coringa (1984)
Rio Sem Tom/ Blue Sued Shows (1987)
Peçam Bis, cantando canções de Ismael Silva ao lado de Dalva Torres (1988)
Let's play that (1994)
O que eu faço é música (1998)
Macalé Canta Moreira (2001), além do single
Participou dos songbooks de Ary Barroso, Noel Rosa e Tom Jobim.
Amor, Ordem & Progresso (2003)
Real Grandeza contendo exclusivamente canções de sua parceria com Waly Salomão: e com a participação de Maria Bethânia, Adriana Calcanhotto e Luiz Melodia, entre outros artistas. (2005)

Macao (2008)


UM POUCO MAIS DE JARDS MACALÉ

Compositores como Tom Zé, Sérgio Sampaio, Jards Macalé, Jorge Mautner, Luiz Melodia, Torquato Neto, Walter Franco, Itamar Assumpção... Quando surgiram, foram logo considerados estranhos no ninho, rotulados como "malditos". Mas uma nova geração os compreende muito bem.

Nada mais natural, então, como deixa claro a cantora Camila Costa, que eles sejam benditos entre os expoentes da nova geração, que homenageiam quatro deles a partir de hoje, no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo.

Além de Camila, estão na programação Andreia Dias cantando Sampaio, Anna Ratto interpretando Tom Zé (com participação de Anelis Assumpção) e a banda feminina Chicas celebrando Mautner. Além de Zeca Baleiro no show com o cancioneiro de Sampaio, Macalé e Mautner participam dos próprios tributos.

Camila idealizou a série "Bendito É o Maldito Entre as Mulheres" e inicia a programação hoje cantando Macalé. Ele sozinho com seu violão já é um show à parte e vai dar mais do que uma canja. Camila vai cantar clássicos e lados B, como "No Meio do Mato" e "Pontos de Luz".

"Não foi fácil realizar esse projeto, mas estou bem feliz com o que consegui, com o patrocínio do CCBB. É a primeira vez que fico do lado de cá, da produção", diz a cantora, que escolheu todo o elenco e assina a direção musical dos shows. A banda que a acompanha só tem feras: Sacha Amback, Marcos Suzano e Rodrigo Campello...

Jards Macalé, primeiro disco do cantor carioca, é um dos trabalhos mais inusitados da música brasileira. Um disco até hoje duro de ser conceituado - e por isso mesmo genial, e tantas vezes esquecido. Feito após Jards ter passado por experiências diversas como músico, o álbum marcava sua transição para a via pop, revolucionando a música brasileira ao mesclar rock, samba, eruditismo, jazz, bossa-nova, tropicalismo, melancolia e sofrimento em doses cavalares.

Gravado às pressas, da forma mais minimalista possível (com Jards no violão, Lanny no violão solo e no baixo e Tutty na bateria), o disco traz uma sonoridade crua, anti-comercial, com letras que chegam a soar punks. O LP abria com "Farinha do desprezo", quase um anti-rock, desconstruído, misturado com samba e jazz (a letra: "só vou comer agora da farinha do desejo/alimentar minha fome para que nunca mais me esqueça/como é forte o gosto da farinha do desprezo").



CURIOSIDADES

*O maior sucesso do LP "Aprender a Nadar", de Jards Macalé foi a regravação do classico "Mambo da Cantareira", de Gordurinha - que serviu de pretexto para Macalé alugar uma barca da travessia Rio-Niterói e pular na Baia da Guanabara ao som da música, na festa de lançamento do álbum. Orora Analfabeta", outro sucesso de Gordurinha também estava no LP e fez grande sucesso.

FONTE



Rolling Stone Brasil - entrevista

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