Sobre o tempo, Mário Lago dizia:
"Discordo quando as pessoas falam 'no meu tempo...'.
Meu tempo é hoje. Fiz um acordo com o tempo:
nem ele me persegue e nem eu fujo dele.
Um dia a gente se encontra".
Mário Lago (Rio de Janeiro, 26 de novembro de 1911 — Rio de Janeiro, 30 de maio de 2002) foi um advogado, poeta, radialista, letrista e ator brasileiro.
Autor de sambas populares como "Ai, que saudades da Amélia" e "Atire a primeira pedra", ambos em parceria com Ataulfo Alves, fez-se popular entre as décadas de 40 e 50.
Filho do maestro Antônio Lago e de Francisca Maria Vicencia Croccia Lago, e neto do anarquista e flautista italiano Giuseppe Croccia, Mário Lago formou-se em Direito pela Universidade do Brasil, em 1933, tendo nesta época se tornado marxista. A opção pelas idéias comunistas fizeram com que fosse preso em sete ocasiões - 1932, 1941, 1946, 1949, 1952, 1964 e 1969.
Foi casado com Zeli, filha do militante comunista Henrique Cordeiro, que conhecera numa manifestação política, até a morte dela em 1997. O casal teve cinco filhos: Antônio Henrique, Graça Maria, Mário Lago Filho, Luiz Carlos (em homenagem ao líder comunista Luís Carlos Prestes) e Vanda.
Torcedor do Fluminense, chegou a declarar, na época do 1º rebaixamento do clube, que a virada de mesa em favor do tricolor carioca havia sido uma atitude vergonhosa de todos os responsáveis, envolvidos no esquema. Ele afirmava veementemente, que o time deveria ter voltado à divisão de elite do Campeonato Brasileiro no campo, e não no tapetão.
Número Um
Compositor: Mario Lago - Benedito Lacerda
Passaste hoje ao meu lado
Vaidosa, de braço dado
Com outro que te encontrou
E eu relembrei comovido
Um velho amor esquecido
Que o meu destino arruinou
Chegaste na minha vida
Cansada, desiludida
Triste, mendiga de amor
E eu pobre, com sacrifício
Fiz um céu do teu suplício
Pus riso na tua dor
Mostrei-te um novo caminho
Onde com muito carinho
Levei-te numa ilusão
Tudo, porém, foi inútil
Eras, no fundo, uma fútil
E foste de mão em mão
Satisfaz tua vaidade
Muda de dono à vontade
Isso em mulher é comum
Não guardo frios rancores
Pois entre teus mil amores
Eu sou o número um.
Mário Lago começou pela poesia, e teve seu primeiro poema publicado aos 15 anos. Formou-se em Ciências Jurídicas e Sociais na década de 30, na então Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro, atual Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde iniciou sua militância política no Centro Acadêmico Cândido de Oliveira, então fortemente influenciado pelo Partido Comunista Brasileiro.
Durante a década de 1930, a então principal Faculdade de Direito da capital da República era um celeiro de arte aliada à política, onde estudaram Lago e seus contemporâneos Carlos Lacerda, Jorge Amado, Lamartine Babo entre outros.
Depois de formado, exerceu a profissão de advogado por apenas alguns meses. Envolveu-se com o teatro de revista, escrevendo, compondo e atuando.
Sua estréia como letrista de música popular foi com "Menina, eu sei de uma coisa", parceria com Custódio Mesquita, gravada em 1935 por Mário Reis. Três anos depois, Orlando Silva realizou a famosa gravação de "Nada além", da mesma dupla de autores.
Suas composições mais famosas são "Ai que saudades da Amélia", "Atire a primeira pedra", ambas em parceria com Ataulfo Alves; "É tão gostoso, seu moço", com Chocolate, "Número um", com Benedito Lacerda, o samba "Fracasso" e a marcha carnavalesca "Aurora", em parceria com Roberto Roberti, que ficou consagrada na interpretação de Carmen Miranda.
"É tão Gostoso seu Moço", por Mário Lago
Em "Amélia", a descrição daquela mulher idealizada, ficou tão popular que "Amélia" tornou-se sinônimo de mulher submissa, resignada e dedicada aos trabalhos domésticos.
Na Rádio Nacional, Mário Lago foi ator e roteirista, escrevendo a radionovela "Presídio de Mulheres". Mas só ficou conhecido do grande público mais tarde, pela televisão, quando passou a atuar em novelas da Rede Globo, como "O Casarão", "Nina", "Brilhante", "Elas por Elas" e "Barriga de Aluguel", entre outras. Também atuou em peças de teatro e filmes, como "Terra em Transe", de Glauber Rocha.
Mário esteve na União Soviética, em 1957, a convite da Rádio Moscou, para participar da reestruturação do programa Conversando com o Brasil, do qual participavam artistas e intelectuais brasileiros. Mas os programas radiofônicos produzidos no Brasil, que Mário mostrou aos soviéticos, foram por eles qualificados de "burgueses" e "decadentes". A avaliação que Mário Lago fez da União Soviética também não foi das melhores. Ali, segundo ele, a produção cultural sofria pelo excesso de gravidade e autoritarismo. Apesar da decepção com a experiência soviética, Mário Lago jamais abandonou a militância política.
Em 1964, foi um dos nomes a encabeçar a lista dos que tiveram seus direitos políticos cassados pelo regime militar, e perdeu suas funções na Rádio Nacional.
Em 1989, ligou-se ao Partido dos Trabalhadores e atuou como âncora dos programas eleitorais do então candidato do partido, Luís Inácio Lula da Silva, à presidência da República, em 1998.
Autor dos livros Na Rolança do Tempo (1976), Bagaço de Beira-Estrada (1977) e Meia Porção de Sarapatel (1986), foi biografado em 1998 por Mônica Velloso na obra: Mário Lago: boêmia e política.
No carnaval de 2001, Mário Lago foi tema do desfile da escola de samba Acadêmicos de Santa Cruz.
Em dezembro de 2001, recebeu uma homenagem especial por sua carreira durante a entrega do Troféu Domingão do Faustão, que, no ano seguinte, ganharia o nome de Troféu Mário Lago, sendo anualmente concedido aos grandes nomes da teledramaturgia.
Em janeiro de 2002, o presidente da Câmara, Aécio Neves, foi à sua residência no Rio para lhe entregar, solenemente, a Ordem do Mérito Parlamentar.
Mário estava escrevendo sua própria biografia. Estava certo de que chegaria aos 100 anos, dizia Mário, "Fiz um acordo com o tempo. Nem ele me persegue, nem eu fujo dele".
Morreu no dia 30 de maio de 2002, aos noventa anos de idade, em sua casa, na Zona Sul do Rio de Janeiro, de enfisema pulmonar. Para o velório foi aberto o palco do Teatro João Caetano onde vivera importantes momentos de sua carreira de ator. Foi sepultado no Cemitério de São João Batista no Rio de Janeiro.
CURIOSIDADES
Desde jovem, Mário se dividiria entre o trabalho artístico, uma intensa atividade política e a boemia. A participação política lhe rendeu seis prisões, a primeira em janeiro de 1932, e a demissão da Rádio Nacional, em 1964, o que resultou em quase um ano de desemprego. Na época do golpe militar, era procurador do Sindicato dos Radialistas do Rio de Janeiro, um dos mais combativos do país.
Mário participou de várias campanhas em defesa dos direitos humanos e do patrimônio do país, como O Petróleo é Nosso, Contra as Armas Nucleares, Campanha da Paz (durante a II Guerra), Anistia (décadas de 40 e 70), Contra a Censura, Diretas Já, Pela Condenação dos Assassinos de Chico Mendes etc. No século XX, não há registro de movimento político do gênero que não tenha tido o apoio e a participação direta de Mário Lago. Curiosamente, jamais foi filiado a qualquer partido. A partir de 1989, passou a dar apoio e militância ao PT, mas sem vínculo de filiação.
Por ter sido estudante do Colégio Pedro II da Unidade São Cristóvão em sua homenagem existe dentro do colégio o Teatro Mário Lago, onde ali se faz apresentações do grupo de teatro do Colégio Pedro II da Unidade Engenho Novo (CRIARTE).
Autor de 11 livros, Mário estreou com a coletânea de poemas políticos O Povo Escreve a História nas Paredes. Poeta e escritor - Sua produção literária inclui os títulos Chico Nunes das Alagoas, Na Rolança do Tempo, Bagaço de Beira Estrada, Rabo da Noite, Meia Porção de Sarapatel, Manuscrito do Heróico Empregadinho de Bordel, Segredos de Família e o infantil Monstrinho Medonhento, seu maior sucesso editorial. Deixou um livro inconcluso, dedicado às memórias das boas “molecagens” que praticou ao longo da vida.
Especial sobre músicas carnavalescas, TV Cultura, déc. de 90, apresentado por Paulinho da Viola.
- Roberto Carlos e Mário Lago
No Especial de 1991 Roberto Carlos cantou com Mário Lago as músicas: "Nada Além", "Atire a primeira pedra" e "Ai que saudade da Amélia".
No dia 09/07/37, estreava no Teatro Recreio, no Rio de Janeiro, a revista Rumo ao Catete, título que aludia a uma eleição presidencial que Getúlio não deixou acontecer. Além de um elenco de primeira - Araci Cortes, Oscarito, Eva Tudor -, a peça tinha libreto e direção musical de dois grandes compositores, Custódio Mesquita e Mário Lago. Reunindo todos esses valores, "Rumo ao Catete" foi um sucesso, com mais de 300 representações e, de quebra, ainda enriqueceu a música popular com duas belas composições, o fox "Nada Além" e a valsa "Enquanto houver saudade".
Maior sucesso da dupla Lago-Mesquita, "Nada Além" era motivo na peça de um quadro cômico-romântico: um homem de aparência simplória examinava, à porta de uma loja, várias mercadorias que lhe oferecia um vendedor. Vendo que o suposto freguês não se decidia, o vendedor o interpelava: "Afinal, o que deseja o cavalheiro?" ao que o sujeito respondia, cantando: "Nada além, nada além de uma ilusão...".
- Nada Além - Sidney Magal
- Mario Lago & Hermeto Pascoal -Três Coisas
Ouça as músicas de Mário Lago aqui...
Memória em movimentoAtor, produtor, diretor, compositor, radialista, escritor, poeta, autor de teatro, cinema, rádio e TV, frasista, militante sindical, ativista político e boêmio, Mário Lago foi muitos.
No ano do centenário de nascimento desse multiartista, o projeto MÁRIO LAGO, HOMEM DO SÉCULO XX mostra, para as diversas gerações, como ele influenciou e se deixou influenciar pela sociedade em que viveu. E afirma a memória de Mário Lago como um patrimônio atemporal, que se faz presente aqui e agora, viva.
"Eu não sou saudosista. Não fico lamentando: ’ah, o meu tempo’. Meu tempo é hoje."– Mário Lago.
FONTE
Nenhum comentário:
Postar um comentário