sexta-feira, 27 de maio de 2016

Elma



Existe uma estranha beleza e um valor incontestável no trabalho de artistas nacionais que lidam com o rock instrumental em suas múltiplas formas. Uma manifestação por vezes esquecida por alguns ouvidos mais “críticos”, mas que está longe de ser encontrada em projetos elaborados em solo estrangeiro: a constante capacidade de experimentar.



 Enquanto nomes de peso da cena internacional que brincam com o gênero e suas inúmeras variáveis se acomodam em uma série de padrões repetitivos depois de alcançada a tão sonhada fórmula base, no Brasil temos um completo oposto desse infeliz padrão, com artistas que mesmo veteranos fazem de cada presente lançamento um novo começo e uma possibilidade de mais uma vez se reinventar.


É o caso da banda mezzo paulistana, mezzo mineira Elma, que ao alcançar dez anos de carreira faz do atual trabalho uma capacidade de perverter tudo aquilo que fora construído previamente. Aos comandos de Fernando Seixlack (bateria), Ricardo Lopes (baixo), Paulo Cyrino (guitarra) e Bernardo Pacheco (guitarra), o mais recente lançamento da banda, Elma LP (2012, Submarine), traz de volta o mesmo espírito entusiasmado dos primeiros singles lançados pelo grupo.


 Costurando por meio de guitarras sombrias e ambientações sujas uma sequência de manifestações acústicas que se alteram a todo o instante, o grupo monta um trabalho que encontra na constante transformação um “padrão” que dá movimento ao disco.



Esqueça o óbvio, tão logo a banda inicia o trabalho, uma chuva de acordes densos e maquinações grosseiras começam a se manifestar. Espécie de preparativo para o que o grupo lentamente esculpe no decorrer do álbum, em A Parte Elétrica o grupo torna perceptível todos os elementos que pouco a pouco compõem a estrutura base do recente projeto. Estão lá as linhas de baixo sufocantes, a dupla de guitarras que praticamente se espancam com o passar do álbum e principalmente a bateria firme (e necessária) de Seixlack.


 Elemento guia do trabalho, as batidas fornecem o ritmo (sempre maleável) e o sustento ao espectador iniciante que trafega pelo álbum, referência que inicialmente surge como um conforto em meio a avalanche de ruídos que percorrem o disco, mas que logo se manifesta como o real motor de toda a explosiva soma de conceitos instáveis que formam o disco.


Abrindo o registro com relativa parcimônia, a cada nova faixa proclamada pelo quarteto, mais esquizofrênica se estabelece a sonoridade que define a produção do registro. Se em um momento os realces típicos do Math Rock fluem como um encontro entre o Battles (do primeiro disco) com os o Fugazi de princípios da década de 1990, logo nos instantes seguinte toda essa proposta já está desfeita. É como se a banda não tivesse a mínima dificuldade em pular de Black Sabbath para os ruídos claustrofóbicos do Sonic Youth em questão de segundos, tornando a execução da obra ao mesmo tempo dinâmica e experimental. Tudo ecoa próximo de algo que já nos é familiar e ainda assim novo, capacidade da banda em absorver o que há de mais sujo no mundo da música e transformar em um som incontestavelmente próprio.

Recheado por composições de realces densos (Smagma) e outras faixas que mantém na aceleração um recurso próprio (Zoltan Ri), Elma LP segue até o ecoar da última composição como um registro de destinos incertos ao ouvinte. Nada parece previsível na maneira como o quarteto expõe as canções, afinal, diferente do que outros projetos assumem, cada faixa lançada pela banda se quebra em inúmeras particularidades e preferências distintas, como se o grupo se separasse na abertura de cada canção, seguindo por um caminho próprio, mas ao final se encontrando em um mesmo ponto. Basta observar os vários rumos delimitados dentro da música Agente para entender do que se trata essa constante mudança de percursos que sustentam o disco.

Conduzido do princípio ao fim pela incerteza da instrumentação e dos rumos – que praticamente são construídos e destruídos no decorrer das faixas -, o registro brinca de maneira intencional com a o descontrole, arremessando o ouvinte de um canto a outro do álbum sem que a banda se importe com os impactos ou possíveis ferimentos que isso possa gerar. Corajoso na maneira como disco passeia experimental por formas e gêneros instrumentais por vezes incompatíveis, há na construção do álbum uma clara noção do que a banda pretende alcançar, afinal, não basta apenas acrescentar ou diminuir ruídos sem um mínimo comprometimento, é preciso saber o que se pretende conquistar com isso, algo que os membros do Elma parecem compreender logo nos primeiros acordes do disco.

FONTE

http://miojoindie.com.br/disco-elma-lp-elma/#more-14349

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