domingo, 19 de dezembro de 2010

Elizeth Cardoso


Elizeth Cardoso (Rio de Janeiro, 16 de julho de 1920 — 07 de maio de 1990) foi uma cantora brasileira. Aos 16 anos Elizeth foi descoberta por Jacob do Bandolim que a levou para cantar na Rádio Guanabara. Logo ela foi considerada uma das maiores intérpretes da música brasileira e um das mais talentosas cantoras de todos os tempos, reverenciada pelo público e pela crítica; uma das maiores cantoras de rádio e orquestra do Brasil dos anos 30 e 40.

Elizete Cardoso - Da cor do Pecado
Composição: Bororó (Alberto de Castro Simões da Silva)

Esse corpo moreno
Cheiroso e gostoso
Que você tem
É um corpo delgado
Da cor do pecado
Que faz tão bem

Esse beijo molhado
Escandalizado que você deu
Tem sabor diferente
Que a boca da gente
Jamais esqueceu

E quando você me responde
Umas coisas com graça
A vergonha se esconde
Porque se revela
A maldade da raça

Esse corpo de fato
Tem cheiro de mato
Saudade, tristeza
Essa simples beleza

Esse corpo moreno
morena enlouquece
Eu não sei bem porque
Só sinto na vida
O que vem de você

Lançado por Sílvio Caldas na melhor fase de sua carreira, "Da Cor do Pecado" (1939/1940) é um grande samba, o melhor do reduzido repertório do compositor Bororó (Alberto de Castro Simoens da Silva).

"Da Cor do Pecado" permanece como um clássico, tendo regravações de artistas como Elis Regina, Elizeth Cardoso, Nara Leão, João Gilberto, Ney Matogrosso, Fagner,Luciana Melo... e os instrumentistas Jacó e Luís Bonfá. Foi música tema da novela homônima da Rede Globo.


VIDA E OBRA

Elizeth Moreira Cardoso nasceu na rua Ceará, no subúrbio de São Francisco Xavier. O pai, seresteiro, tocava violão e a mãe gostava de cantar. Desde os cinco anos, Elizeth cantava pelos bairros da Zona Norte carioca, cobrando ingresso (10 tostões) das outras crianças para ouvi-la cantar os sucessos de Vicente Celestino.


Desde cedo precisou trabalhar e, entre 1930 e 1935, foi balconista, funcionária de uma fábrica de saponáceos e cabeleireira, até que o talento foi descoberto aos dezesseis anos, quando comemorava o aniversário. Foi então convidada para um teste na Rádio Guanabara (fundada em 1936 - atual Rádio Bandeirantes Rio de Janeiro), pelo músico, compositor e bandolinista de choro Jacob do Bandolim.

Apesar da oposição inicial do pai, apresentou-se em 1936 no Programa Suburbano, ao lado de Vicente Celestino, Araci de Almeida, Moreira da Silva, Noel Rosa e Marília Batista. Na semana seguinte foi contratada para um programa semanal na rádio.

Casou-se no fim de 1939 com o cavaquinista, comediante e compositor Ari Valdez, com quem teve um filho, Paulo César Valdez; mas o casamento durou pouco. *Ari gostava muito da boêmia e da bebida. Os contemporâneos, como Dino Sete Cordas, afirmam que Tatuzinho, como era conhecido nos meios artísticos, tinha problemas mentais. Bebia muito e tinha manias estranhas. Costumava sair nu pelas ruas. Elizeth declarou, algumas vezes, que Ari já havia sido internado em clínicas psiquiátricas. Segundo o violonista e amigo Luís Bittencourt, Tatuzinho "tocava muito bem, mas tinha um parafuso a menos". *(Dicionário Cravo Albin da MPB)

Após o fim do casamento, Elizeth passa a se apresentar em circos e cabarés, muitas vezes em dupla com o comediante Grande Otelo. Trabalhando também como taxi-girl (moça que recebe por dança com clientes de boates) - e crooner de várias orquestras.

Em 1941, tornou-se crooner de orquestras, chegando a ser uma das atrações do Dancing Avenida, que deixou em 1945, quando se mudou para São Paulo para cantar no Salão Verde e para apresentar-se na Rádio Cruzeiro do Sul, no programa Pescando Humoristas.

Além do choro, Elizeth consagrou-se como uma das grandes intérpretes do gênero samba-canção (surgido na década de 1930), ao lado de Maysa Monjardim, Nora Ney, Dalva de Oliveira, Ângela Maria e Dolores Duran. O gênero, comparado ao bolero, pela exaltação do tema amor-romântico ou pelo sofrimento de um amor não realizado, foi chamado também de dor-de-cotovelo ou fossa.

Em 1947 lança o primeiro compacto, que é recolhido das lojas por apresentar defeitos técnicos. Grava pela segunda vez em 1949, alcançando êxito com as canções Canção de Amor e Complexo.


Em 1951, Elizeth emplacou seu primeiro sucesso "Canção de Amor", de Chocolate (Dorival Silva) e Elano de Paula (Poeta, compositor Elano Viana de Oliveira Paula é irmão do comediante Chico Anyzio).

A entrada da editora Todamérica no mercado fonográfico ensejou o aproveitamento de vários artistas, sem oportunidade em outras gravadoras. Entre estes estava Elizeth Cardoso, que despontou para o estrelato logo em seu primeiro disco na empresa, com o samba "Canção de Amor".

Possuidora de um belo timbre de voz e de um estilo personalíssimo de cantar, Elizeth soube valorizar muito bem a melodia deste samba, considerada avançada na época. Aliás, era uma característica de seu autor, o comediante Chocolate, a predileção por melodias sofisticadas.

Mais conhecida pelo verso inicial - "Saudade, torrente de paixão" -, "Canção de Amor" foi lançada em outubro de 50, alcançando as paradas de sucesso em abril do ano seguinte, nelas permanecendo por quatro meses.

Canção de Amor
Composição: Chocolate - Elano de Paula

Saudade
Torrente de paixão, emoção diferente
Que aniquila a vida da gente
Uma dor que eu não sei de onde vem
Deixaste o meu coração vazio
Deixaste a saudade
Ao desprezares aquela amizade
Que nasceu ao chamar-te meu bem
Nas cinzas do meu sonho
Um hino então componho
Sofrendo a desilusão que me invade
Canção de amor saudade.

Um de seus maiores sucessos é Barracão, de 1952. Ainda em 1952, Elizeth Cardoso canta o samba "Ingratidão" de Greco, Albanir e Rutinaldo no filme "É Fogo Na Roupa" de Watson Macedo. Na cena ainda estão Heloísa Helena e Ivon Curi.

Elizeth Cardoso - "Ingratidão"

CANÇÃO DO AMOR DEMAIS ANUNCIA A BOSSA NOVA

O primeiro LP de Elizeth Cardoso sai em 1958. Com o lançamento do disco "Canção do Amor Demais" a Divina entrou para a história da música popular brasileira. Com canções de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, o disco tornou-se símbolo do nascimento da bossa nova.


Considerado como o marco inicial da Bossa Nova "Canção do Amor Demais", com Elizete Cardoso, tornou-se um disco histórico na música popular brasileira por ter revelado pela primeira vez a batida do violão de João Gilberto. Com 13 canções de Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, Canção do Amor Demais (foi relançado em 1998 pela Biscoito Fino em comemoração aos 50 anos da Bossa Nova).

Gravado pelo selo Festa, do jornalista Irineu Garcia, dois anos depois da estréia da peça "Orfeu da Conceição", que marcou o início da parceria de Tom e Vinicius, "Canção do Amor Demais" é, segundo o poeta no texto do encarte:

''a maior prova que podemos dar da sinceridade dessa amizade e dessa parceria. A partir dos sambas de Orfeu da Conceição, raras têm sido as vezes em que, de um encontro meu com o maestro, não resulta alguma composição nova, por isso que eu creio ser essa a verdadeira linguagem da nossa relação.(...) E nunca houve entre nós quaisquer reservas no sentido de um tirar o outro de um impasse durante o trabalho. É possível mesmo que tudo isso se deva ao fato de que ele crê na poesia da música e eu creio na música da poesia''.

É ainda Vinicius quem explica porque Elizete Cardoso foi convidada para cantar no LP:

''É claro que, por ela interpretado, ele nos acrescenta ainda mais, pois fica sendo a obra conjunta de três grandes amigos; a gente que se quer bem para valer; gente que pode, em qualquer circunstância, contar um com o outro; gente, sobretudo, se danando para estrelismos e vaidades e glórias. Mas a diversidade dos sambas e canções exigia também uma voz particularmente afinada; de timbre popular brasileiro mas podendo respirar acima do puramente popular...E assim foi que a Divina impôs-se como a lua para uma noite de serenata''.


Gravado com uma roupagem orquestral altamente sofisticada, como explicou o jornalista Sérgio Augusto no Cancioneiro Jobim (2000), encorpada por instrumentos (trompa, oboé, harpa, fagote, clarone) raramente usados para acompanhar músicas populares, o por vezes camerístico "Canção do Amor Demais" contou com a participação muito especial - em duas faixas (Chega de Saudade e Outra Vez) - de um baiano chamado João Gilberto, cujo violão não tinha, sem hipérbole, similar, e de quem muito se ouviria falar nos meses, anos e décadas seguintes''.

Além de João Gilberto, Tom Jobim escolheu também outros músicos de sua preferência, como o flautista Copinha, os trombonistas Gaúcho e Maciel, a violoncelista Nídia Soledade e o baterista Juca Stockler.

No repertório, nove músicas de Tom e Vinicius (Chega de Saudade, Caminho de Pedra, Luciana, Janelas Abertas, Eu não Existo sem Você, Estrada Branca - só com Elizete e Tom ao piano -, Vida Bela, Modinha, Canção do Amor Demais); duas de Tom (As Praias Desertas e Outra Vez) e duas de Vinicius (Serenata do Adeus e Medo de Amar). À exceção de "Outra Vez" e "Eu não Existo sem Você", todas eram inéditas em disco.


Anos depois, em "Carta ao Tom 74", música composta com Toquinho, Vinicius de Moraes relembra este momento marcante de sua vida: ''Rua Nascimento Silva 107, você ensinando pra Elizete as canções de Canção do Amor Demais/Lembra que tempo feliz ai que saudade/Ipanema era só felicidade/era como se o amor morresse em paz''.


O samba-canção antecedeu o movimento da bossa nova (surgido ao final da década de 1950, 1957), com o qual Maysa já foi identificada. Mas este último representou um refinamento e uma maior leveza nas melodias e interpretações em detrimento do drama e das melodias ressentidas, da dor-de-cotovelo e da melancolia.

Elizeth migrou do choro para o samba-canção e deste para a bossa nova gravando em 1958 o LP Canção do Amor Demais, considerado axial para a inauguração deste movimento, surgido em 1957.


Em 1960, Elizeth Cardoso gravou jingle para a campanha vice-presidencial de João Goulart. SHOW DO VOTO LIVRE - Propaganda política para Vice-Presidente da República de João Goulart (Jango). AUTOR: Miguel Gustavo. ANIMADOR: Cesar de Alencar. PS: Gravação em disco de 78 rpm. com Jorge Veiga, Dircinha Batista, Luiz Vieira, Altamiro Carrilho, Elizeth Cardoso, Ivon Cury, Isaura Garcia, Grupo Farroupilha...


Na década de 60, Elizeth Cardoso estrelou programas de TV como o Bossaudade -  (TV Record, Canal 7, São Paulo). Em abril de 1965 conquistou o segundo lugar na estréia do I Festival de Música Popular Brasileira (TV Record) interpretando Valsa do amor que não vem (Baden Powell e Vinícius de Moraes); o primeiro lugar foi da novata Elis Regina, com Arrastão. Serviu também de influência para vários cantores que viriam depois, sendo uma das principais a cantora Maysa Monjardim.


Em 1961, Elizeth Cardoso, no LP "A Meiga Elisete nº 2", incluiu "Esmola", do  pianista, compositor e produtor musical João Roberto Kelly. Também regravou "Boato" no LP "Sax Voz nº 2", de Elizeth Cardoso e Moacyr Silva.


Em 1962-63, Elizete Cardoso gravou "Se Vale a Pena", de João Roberto Kelly, no LP "A meiga Elizete nº 3", lançado pela gravadora Copacabana.


Participou em 1968 de shows antológicos sob a direção de Hermínio Bello de Carvalho como o Rosa de Ouro e o show no Teatro João Caetano ao lado de Jacob do Bandolim, Época de Ouro e Zimbo Trio (lançado em CD pela Biscoito Fino na caixa Faxineira das Canções), em benefício do Museu da Imagem e do Som (MIS) (Rio de Janeiro). Considerado um encontro histórico da música popular brasileira, no qual foram ovacionados pela platéia; long-plays (Lps) foram lançados em edição limitada pelo MIS. Sua ligação com o samba tornou-se mais evidente nos discos Elizeth Sobe o Morro e A Enluarada Elizeth.


Elizeth "recebeu" vários apelidos, tais como: A Noiva do Samba-Canção, Lady do Samba, Machado de Assis da Seresta, Mulata Maior, A Magnífica (apelido dado por Mister Eco) e a Enluarada (por Hermínio Bello de Carvalho). Porém nenhum desses títulos, se igualou ao que foi consagrado por Haroldo Costa - A Divina - que a marcou para o público e para o meio artístico. Ela lançou mais de 40 LPs no Brasil e gravou vários outros em Portugal, Venezuela, Uruguai, Argentina e México.

Elizeth Cardoso morreu aos 69 anos, vítima de câncer.


DISCOGRAFIA

Álbuns de estúdio e compilações
(1955) Canções à Meia Luz
(1956) Fim de Noite
(1957) Noturno
(1958) Retrato da Noite
(1958) Canção do Amor Demais
(1958) Naturalmente
(1959) Magnífica
(1960) Sax Voz
(1960) A Meiga Elizeth
(1961) Sax Voz nº 2
(1962) A Meiga Elizeth nº 2
(1963) A Meiga Elizeth nº 3
(1963) Elizeth Interpreta Vinícius
(1963) A Meiga Elizeth nº 4
(1963) Elizeth Canta Seus Maiores Sucessos
(1963) Grandes Momentos com Elizeth Cardoso
(1964) A Meiga Elizeth nº 5
(1965) Quatrocentos anos de samba
(1965) Elizeth sobe o morro
(1966) Muito Elizeth
(1966) A bossa eterna de Elizeth e Cyro – Elizeth Cardoso e Cyro Monteiro
(1967) A enluarada Elizeth
(1968) Ao vivo no Teatro João Caetano - Elizeth Cardoso, Zimbo Trio e Jacob do Bandolim - Vol. I e II
(1968) Momento de Amor
(1969) Elizeth e Zimbo Trio na Sucata
(1970) Elizeth no Bola Preta com a Banda do Sodré
(1970) Falou e disse
(1970) É de manhã - Elizeth Cardoso e Zimbo Trio
(1970) Elizeth, a exclusiva
(1970) A bossa eterna de Elizeth e Ciro - Nº 2 - Elizeth Cardoso e Cyro Monteiro
(1971) Elizeth Cardoso
(1971) Elizeth Cardoso - Disco de ouro
(1971) Elizeth Cardoso e Silvio Caldas
(1971) Elizeth Cardoso e Silvio Caldas - Vol. II
(1972) Preciso Aprender A Ser Só
(1972) Elizeth Cardoso

Barracão - Simone e Elizete Cardoso

(1974) Edição histórica - VOL. 3
(1974) Elizeth / Feito em Casa
(1974) Mulata Maior
(1975) Bossaudade - A bossa eterna
(1975) Elizeth Cardoso
(1976) Elizeth Cardoso
(1977) Elizeth Cardoso, Jacob do Bandolim, Zimbo Trio e Época de Ouro
(1978) A Cantadeira do Amor
(1978) Live in Japan
(1979) O Inverno do meu Tempo
(1980) Elizeth Cardoso nº 1
(1980) Elizeth Cardoso nº 2
(1980) Elizeth Cardoso nº 3
(1981) Elizethíssima
(1982) Outra vez Elizeth
(1982) Recital
(1983) Elizeth - Uma rosa para Pixinguinha
(1984) Leva meu Samba - Elizeth Cardoso e Ataulfo Júnior
(1986) Luz e Esplendor
(1989) Elizeth Cardoso
(1989) Elizeth Cardoso - Jacob do Bandolim - Zimbo Trio e Conj. Época de Ouro
(1991) Todo Sentimento
(1991) Ary Amoroso

FONTE



Cifrantiga "Canção de Amor"

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