Diário da Música: João Carlos Martins: "No carnaval 2011, será homenageado pela escola de samba Vai-Vai, com o enredo A música venceu." O maestro João Carlos Martins é um exemplo de superação.
Pianista, enfrentou vários problemas - de acidentes à doenças - que limitaram o movimento de suas mãos. Virou maestro e se dedicou à causa social com a sua orquestra Filarmônica Bachiana Sesi-SP. Essa história acabou em samba e ele será homenageado neste ano pela Vai-Vai com o enredo "A Música Venceu".
A Saracura contará com o apoio do renomado carnavalesco para o desenvolvimento do enredo 2011
Brasileiro, filho de descendentes de espanhol e belga, Alexandre Louzada é carnavalesco com mais de 15 agremiações em seu histórico. Muito experiente no mercado artístico, viajou várias vezes aos Estados Unidos para aprimorar seu conhecimento, o que inclui workshops nos estúdios da Warner Bros e Disney. Contratado pela Vai-Vai desenvolverá o enredo A Música Venceu, ao lado da comissão de carnaval da Escola.
São 26 anos de carreira e quatro campeonatos. Sua trajetória é marcada por temas inesquecíveis e campeões como: Chico Buarque de Holanda, na Estação Primeira de Mangueira e Soy loco por ti, America – A Vila canta a latinidade, pela Vila Isabel. Na agremiação de Nilópolis, comemorou três títulos seguidos e continua como carnavalesco da Beija-flor. Foi homenageado pela escola de samba Unidos do Marimbondo, de São Gonçalo com o enredo "Alexandre Louzada, o mago do asfalto".
Com cinco títulos ele se define como um artesão do carnaval, uma mistura de tudo e acredita que sua marca é diferente a cada carnaval. A respeito do trabalho em comissão ele é otimista; “A gente pode dividir as responsabilidades e, certamente seis olhos enxergam melhor do que dois. São mais pessoas para ver os defeitos, para reparar se alguma coisa não está boa”, relata.
Fragmentos da sinopse para o carnaval de 2011 da Vai-Vai revelam o perfil lúdico e peculiar do nosso carnavalesco que tem participado ativamente do desenvolvimento do enredo. Na ponte aérea Rio/São Paulo confira um pouco de sua criação para o próximo enredo da Vai-Vai:
“Ao escolher contar a vida de João Carlos Martins em forma de enredo, o Vai Vai enaltece um dos mais festejados intérpretes da música erudita em nossa história contemporânea. Na verdade, é uma sinfonia inacabada, pois a cada dia, João Carlos Martins nos surpreende com sua força de vontade e talento, nos brindando com belas apresentações acompanhado de suas orquestras.
Pisamos a avenida, como quem adentra ao palco de um teatro sob o brilho feérico da ribalta. Cada cantar, cada passo, cada batida, altos e baixos, são notas e tons de uma partitura que se compõe agora em forma de samba, bem mais do que isso, é nossa emoção, nosso coração pulsando, com a mesma garra, o mesmo espírito de luta para superar todo e qualquer obstáculo, é nosso orgulho dizer que a música venceu!
Torna esta avenida o palco, a pauta onde se compõe a sinfonia, em notas que se juntam a contar uma vida e seus movimentos, a saga das mãos de tantas conquistas.
Viver e sofrer é a rima, a sina, o sonho, a “sonata”, solo de seu instrumento, sua guerra fria ao teclado, entre o querer e o poder, compasso do destino, tempo, longo e longe, que o leva distante, à sorte, sortilégio cigano, derradeiro golpe, que cessa, interrompe.
A saga das mãos continua a nos ensinar uma lição de vida, um exemplo de força e talento. Hoje a Vai-Vai é uma orquestra a tocar esta sua sinfonia, obra prima, viva, notas da vida que seu destino escreveu neste palco iluminado esta “cantata” clama: A música venceu! Bravo! João Carlos Martins!
RODA DE SAMBA_ Como a Vai-Vai entrou na sua vida?
JOÃO CARLOS MARTINS_ Eu já li muitos artigos contando a minha história como uma lição de vida. Lição de vida foi a Vai-Vai, pelo amor da comunidade a uma causa. Durante o ano inteiro eles têm um sonho, fora as obrigações profissionais de cada um. A Vai-Vai é tão forte quanto a família de cada um. Ficou sendo uma lição para mim do amor da comunidade.
Mas como começou essa relação entre o senhor e a escola?
(Em 2007) Teve uma "Virada Cultural" em São Paulo. A nossa orquestra não fazia parte da programação, mas eu resolvi aproveitar aquele embalo e propus ao Thobias, que era o presidente da escola na época, experimentar a 5ª de Beethoven com a bateria da Vai-Vai. O (maestro) Isaac Karabtchevsky tinha feito Mozart com a Mangueira. Eu falei: "São Paulo não pode ficar a reboque do Rio. Vamos fazer tão bem ou melhor." E nós fizemos tão bem quanto. As duas baterias que mais me empolam são as da Vai-Vai e da Mangueira.
O senhor era amigo do Thobias?
Não. Telefonei no escuro. Falei: "Vou levar minha orquestra ai." E nasceu uma história de amor logo no primeiro dia. A bateria da Vai-Vai tocou hoje com a orquestra Bachiana na Praça Victor Civita, em Pinheiros
O senhor sempre fez um trabalho de popularizar a música clássica. A sua participação no Vai- Vai mostra que isso é possível?
Sem dúvida. No ano passado, foram 200 concertos. Concertos para atrair novos públicos para a música clássica só foram dez. Foram dois com o Chitãozinho e Xororó, seis com a Vai-Vai, um com a Fafá de Belém, um com a Simone e um com o DJ Anderson Noise. Os outros 190 foram só na música clássica. E nesses dez ou onze que nós fizemos, atraímos um público maravilhoso para o universo da música clássica. No fundo, isso foi 5% das minhas atividades. Eu acho que se todo artista clássico tira 5%, 10%, 15% para democratizar e entrar em outros universos, a música clássica no Brasil estaria em outro patamar.
Como é o trabalho para formar os jovens da orquestra Bachiana?
Começou há seis anos. Eu juntei quarenta e poucos jovens, todos na faixa dos 16 anos. Eu disse para eles que antes de encerrar o sexto ano, eles estariam ou no palco do Carnegie Hall ou do Lincoln Center (casas de espetáculos de Nova York). Um mês e oito dias antes de interar o sexto ano, todos pisaram no palco do Lincoln Center, em Nova York. Durante quatro anos foi uma luta de todo mundo no idealismo, até que finalmente a orquestra transformou-se em Filarmônica Bachiana Sesi-SP. Eu fui pedir ao Sesi adotar um dos músicos e eles adotaram a orquestra inteira. Para nós foi uma vitória. É a única orquestra da iniciativa privada e eles levaram o nome do Brasil lá em cima em Nova York. Neste ano, eles voltam lá fazendo Bach e Vivaldi na primeira parte e, na segunda, mostram a influência da África no Brasil com a Bachiana e a bateria da Vai-Vai em pleno Lincoln Center. Dia 25 de setembro, um domingo, às 18h.
Quando o senhor ligou para o Thobias aquele dia, esperava chegar tão longe na parceria?
Nunca. No dia que me convidaram para ser o enredo de 2011 precisava de um balde lá em casa para as lágrimas.
Com quais comunidades você realiza o trabalho de formação dos jovens para a orquestra?
Eu trabalho em várias comunidades: no bairro do Jaraguá, Ermelino Matarazzo, Paraisópolis, Guarulhos, Suzano, Cariacica, no Espírito Santo, João Monlevade e Contagem, em Minas Gerais. Já são mais de mil e poucas crianças que fazem parte do nosso projeto. E o meu trabalho é sempre voluntário.
Como que é processo de seleção para ver quem vai para Nova York, por exemplo?
Os 45 que eu selecionei há seis anos, foi um trabalho que eu chamo "Disciplina de um Atleta e Alma de um Poeta". Todos trabalharam com esse foco. Hoje estão todos profissionais, eu diria. Com 22, 23 anos, são todos profissionais.
O senhor já tinha imaginado a sua vida como enredo de escola de samba?
Todo mundo tem um sonho. Há dez anos, quando voltei a morar no Brasil, eu estava assistindo ao Carnaval e na minha cabeça passou: "Meu Deus, antes de morrer seria legal se eu pudesse ser o enredo de uma escola". Mas eu falei que era um impossible dream (sonho impossível). E de repente o impossible dream virou realidade.
O senhor está muito presente nos ensaios da Vai-Vai. O que te faz estar lá sempre?
Eu acho que a vida é feita de cumplicidade. Eu sei de muitas homenagens que houve no Brasil para artistas, que praticamente apareceram só no dia, ou em um ou outro ensaio. Eu acho que é uma troca de carinho, de amor, de respeito. Se eu apareço em todos os ensaios e treino, inclusive a regência da bateria, que eu fico treinando, eu acho que é uma forma de mostrar que não existe nada de mão única na vida. Só conheço coisas de mão dupla. A minha retribuição para a Vai-Vai é, pela primeira vez na história do Brasil, uma bateria de escola de samba pisar no principal teatro do mundo. O que a Vai-Vai fará por mim na avenida, a única forma de eu retribuir é levando a Vai-Vai para Nova York.
Qual a emoção de reger a bateria?
É bárbaro. Sabe por quê? Eles fingem que estão me seguindo. Eles não precisam de mim. Mas na dinâmica a gente faz mil coisinhas em parceria que ficam legais. Daqui a pouco eu vou convidar o Mestre Tadeu para reger a Bachiana (risos).
Como a música clássica entrou na sua vida?
Eu falo que entrou em 1898, quando meu pai nasceu. Com 10 anos, ele gostaria de ser pianista em Portugal. Mas três dias antes da primeira aula, meu pai teve parte da mão decepada. Ele não pôde realizar o sonho dele. 40 anos depois, em 1948, com 8 anos, eu iniciava meus estudos para ajudar a realizar o sonho dele e realizar o meu sonho.
O senhor tinha esse sonho ou era para realizar o do seu pai?
Quando eu vi o piano a primeira vez, de noite, eu fui dedilhar. De madrugada eu desci a escada e fui botar a mão no piano. Foi amor a primeira vista. Piano ou é fácil ou é impossível. Nunca é difícil.
Com todas as dificuldades que o senhor passou, algum momento pensou em parar?
Todo mundo tem os momentos de incerteza. Eu também tive, mas talvez tivesse uma força motora que me levasse a voltar. E essa força ficou muito mais forte aos 64 anos, quando eu uni a música com a responsabilidade social. Eu comecei a me sentir muito melhor como pessoa.
A música venceu?
O que você acha (ele exibe a camiseta da orquestra Bachiana)? Se Deus quiser, vamos poder falar que a música venceu logo depois do Carnaval!
FONTE
Diário de São
vai-vai
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