terça-feira, 12 de julho de 2011

Elisa Coelho


Chamada pelo compositor Heckel Tavares de "Pássaro Cantador", Elisinha, como era conhecida, foi um grande sucesso do rádio, nos anos 30 e 40. Como curiosidade, vale lembrar que Elisa Coelho (uma das primeiras divas do rádio, mãe do jornalista Goulart de Andrade) foi a primeira cantora a gravar a música "No Rancho Fundo", de Ary Barroso e Lamartine Babo, em 1931, pela Victor, com insistência de Ary Barroso.


Elisa Coelho (Elisa de Carvalho Coelho), cantora, nasceu em Uruguaiana/RS em 1/3/1909. Filha do médico Marcelino Coelho e Acelina Piernard de Carvalho. Toda a família morava no Sul e foi para o Rio de Janeiro pela carreira de Elisinha. Seu pai foi tenente do Exército e sua mãe, Acy Carvalho, escritora e jornalista, responsável pela seção feminina de O Jornal, do Rio de Janeiro/RJ.

Elisinha, como era conhecida, costumava cantar acompanhando-se ao piano em reuniões na casa da família, no Rio de Janeiro. Em 1929, um coronel amigo de seu pai e diretor da Rádio Clube do Brasil (hoje Mundial) convidou-a para cantar na emissora.


Em 1930, levada por Josué de Barros, gravou seu primeiro disco na Victor, com A minha viola é de primeira e Capelinha de melão, sambas de Tia Amélia.


Seu segundo disco continha os sambas Escrita errada (Joubert de Carvalho) e Iaiazinha (Plinio Brito).


Em fins de 1930, convidada por Hekel Tavares, interpretou canções do compositor numa série de recitais na Bahia e outros Estados do Nordeste.

Christl Ehlers, em cenas de 1930.
Canta Elisa Coelho (Elisinha)
"O que foi que eu fiz", 1931.

(O que foi que eu fiz" , composição de Augusto Vasseur e Luiz Peixoto, interpretação da cantora gaúcha Elisa Coelho (1909-2001), gravadora Parlophon, lado B, 1931).

Em 1931, Ary Barroso convidou Elisa Coelho para fazer a gravação de seu samba-canção "No Rancho Fundo"Ary Barroso, que era seu grande admirador, não apenas a escolheu para realizar a primeira gravação de "No rancho fundo", como também a acompanhou ao piano, com Rogério Guimarães ao violão, numa rara gravação, realizada nos estúdios da RCA Victor, onde é cantado integralmente o belo poema que projetou nacionalmente a intérprete.

NO RANCHO FUNDO
(Ary Barroso / Lamartine Babo)
No rancho fundo
Bem prá lá do fim do mundo
Onde a dor e a saudade
Contam coisas da cidade...

No rancho fundo
De olhar triste e profundo
Um moreno canta as mágoas
Tendo os olhos rasos d'água...

Pobre moreno
Que de noite no sereno
Espera a lua no terreiro
Tendo um cigarro
Por companheiro...

Sem um aceno
Ele pega na viola
E a lua por esmola
Vem pro quintal
Desse moreno...

No rancho fundo
Bem prá lá do fim do mundo
Nunca mais houve alegria
Nem de noite, nem de dia...

Os arvoredos
Já não contam
Mais segredos
E a última palmeira
Já morreu na cordilheira...

Os passarinhos
Internaram-se nos ninhos
De tão triste esta tristeza
Enche de trevas a natureza...

Tudo por que
Só por causa do moreno
Que era grande, hoje é pequeno
Pra uma casa de sapê...

Se Deus soubesse
Da tristeza lá serra
Mandaria lá prá cima
Todo o amor que há na terra...

Porque o moreno
Vive doido de saudade
Só por causa do veneno
Das mulheres da cidade...

Ele que era
O cantor da primavera
E até fez do rancho fundo
O céu melhor
Que há no mundo...

Se o sol queimando
Uma flor lá desabrocha
a montanha vai gelando
Lembrando o aroma a cabrocha

A história de No rancho fundo, composição de Lamartine Babo (1904-1963) e Ary Barroso(1903-1964), datada de 1930, começou a partir de outra canção, denominada "Na grota funda (Esse mulato vai ser meu)", criada por Ary Barroso com versos de J. Carlos, renomado caricaturista que na ocasião faria sua estréia no teatro de revista. "Na grota funda" foi lançada pela grande estrela Aracy Cortes aos 13 de junho de 1930 na revista "É do outro mundo", no palco do Theatro Recreio, RJ.

"Na grota funda"
Na grota funda
na virada da montanha
só se conta uma façanha
do mulato da Raimunda
Matou a nega
com um pedaço de canela
e depois sem mais aquela
foi juntá c'uma galega
Ela morreu
na virada da montanha
vai havê outra façanha
esse mulato vai sê meu
Esse mulato
vai fazendo o que ele qué
já matou duas muié
porque bamba ele é de fato
Se não morreu
vou mansá esse cachorro
na virada ali do morro
esse mulato vai sê meu.

Diz a história que Lamartine Babo esteve na platéia de referida revista, não teria gostado da letra e criado a sua própria, lançando-a dias depois em seu programa "Horas Lamartinescas" na PRB-7, Radio Educadora do Rio de Janeiro. O sucesso inquestionável da nova composição teria causado o rompimento das relações entre J. Carlos e Ary Barroso.

Levada ao disco pela gravadora Victor (disco 33444), lançado em agosto de 1931, e publicada pela Mangione (partitura E.M. 41), "No rancho fundo" também seria cantada no mesmo palco do Theatro Recreio pela cantora chilena Malena de Toledo, na revista "Miss Ester Lina", com estréia aos 09 de outubro de 1931.


Conta-se que Lamartine Babo escutou "Na Grota Funda", melodia de Ary Barroso com letra de J.Carlos, numa revista musical. Não gostou da letra, e sem mesmo pedir licença ao autor, apresentou a composição de Ary pela Radio Educadora com sua própria letra, interpretada pelo Bando de Tangará, assim inaugurando sua parceria em "O Rancho Fundo". J.Carlos não aceitou o fato, pediu explicações, e a desavença com Ary Barroso foi longa.

Ary Barroso escrevera a peça musical chamada “É do Balaco-Baco”, onde incluía o poema do caricaturista J. Carlos, chamado “Na Grota Funda”, que musicara. Eis a poesia:

Na grota funda
Na virada da montanha
Só se conta uma façanha
Do mulato da Reimunda.

Lamartine assistiu à revista e vidrou na melodia. Foi para casa, modificou a letra e nasceu o belíssimo No Rancho Fundo.

No rancho fundo
Bem pra lá do fim do mundo
Onde a dor e a saudade
Contam coisas da cidade.

Elisa Coelho gravou mais músicas de Ary Barroso. Em 1931, Terra de iaiá e Batuque, em dueto com Sílvio Caldas, e Tenho saudade e É bamba.


Em 1932, gravou a canção Primeiro amor e o samba-canção Palmeira triste, entre outras.


Elisa Coelho - Nega Maria - 1932

Atuando em diversas emissoras, para o Carnaval de 1933 gravou as marchas Coração de picolé (Paulo Neto de Freitas) e Fon-fon (Heitor dos Prazeres).


Em 1934 fez suas últimas gravações, com destaque para um disco na RCA Victor em que, acompanhada dos Irmãos Tapajós. interpretou Dança negra (Hekel Tavares e Sodré Viana) e, do outro lado, Humaitá, folclore recolhido por Hekel Tavares, e Biá-tá-tá (Hekel Tavares e Jaime D’Altavilla), e para outro clássico: o samba-canção Caco velho (Ary Barroso), seu único disco na Odeon.


Sua discografia compõe-se de 15 discos com 30 músicas, sendo 11 de autoria de Ary Barroso. Em 1935 e 1936, apresentou-se no Uruguai e na Argentina.

Em 1938 foi atriz e cantora na peça Malibu, de Henrique Pongetti, encenada pela Companhia de Raul Roulien.


Apresentou-se no Cassino da Urca, onde também fez duetos com astros internacionais como Pedro Vargas e Jean Sablon e onde, em 1939, ensinou Josephine Baker a cantar em português o samba O que é que a baiana tem?, de Dorival Caymmi.


(Joséphine Baker esteve no Brasil em 1929, apresentando-se no teatro Cassino, Rio de Janeiro e teatro Santana em São Paulo,onde foi acompanhada pelo músico brasileiro Benedito Lacerda,integrante na época,do grupo Boêmios da Cidade. Em 1939, Joséphine foi contratada para apresentações no Cassino Atlântico,Rio de de Janeiro.Foi quando, acompanhada de Heitor dos Prazeres, Paulo da Portela, entre outros sambistas,conheceu a noite carioca e a macumba (cf.Petrônio Domingues / Estudos Históricos/RJ). Foi nesta visita também que Elisa Coelho ensinou Joséphine a cantar em português o samba "O que é que a baiana tem", de Dorival Caymmy...).

Em 1989, a gravadora Revivendo lançou o LP No rancho fundo, com interpretações de Elisa Coelho, Jesy Barbosa, Sílvio Caldas e Breno Ferreira.

CDs: Brasil, canto de amor, 1991. Revivendo RVCD 015; Ari Barroso, o mais brasileiro dos brasileiros, 1993, Revivendo RVCD-040.

Viva o Meu Brasil - Elisa Coelho

CURIOSIDADES

*Elisa Coelho casou-se pela primeira vez com Flávio Goulart de Andrade, filho do senador Eusébio Goulart de Andrade.

*Elisinha casou-se pela segunda vez com José Inácio da Costa Couto, que era “croupier” de um casino. Conheceram-se numa “tournée” e ela abandonou a carreira.

*O seu filho, o jornalista Goulart de Andrade, falou da carreira da sua mãe. “O Rádio na época em que ela começou tinha características elitistas. Alguns artistas eram recrutados da sociedade. Até os anos 30 era chique trabalhar no Rádio e não havia preconceito contra os artistas; este veio, com a popularidade do veículo. A minha mãe era comadre de Carmem Miranda, de quem sou afilhado. [...] Essa é a estória de uma cantora que foi rica, importante e talentosa.”


*A cantora Carmina Juarez lança o CD "Tenho Saudades", um pouco da história da música brasileira e do clima musical entre as décadas de 30 a 50. O CD é uma homenagem a Elisinha Coelho, cantora que teve projeção nacional, em 1936, inaugurou a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, assinando em seguida seu primeiro contrato de exclusividade na Rádio Mayrinque Veiga.


*Um dos entrevistados do programa é o jornalista e apresentador de TV (do célebre Comando da madrugada) Goulart de Andrade, filho de Elisinha. A cantora Carmina Juarez, que dedicou um trabalho inteiramente ao repertório de Elisinha, e o historiador e escritor Jairo Severiano completam a trajetória contada no programa por Luis Antônio Giron. Como faixa-bônus, um trecho do depoimento de Goulart de Andrade em que fala de como como uma lei federal, ditada pelo então presidente da República Eurico Gaspar Dutra (1946-1951), mudou a história da carreira de sucesso de sua mãe. Comenta ainda de seu pai, sua avó e da primeira crônica que escreveu aos 16 anos de idade para um jornal carioca.

FONTE




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